sábado, 3 de outubro de 2015

Em busca do sábio perdido

“O que repreende o escarnecedor, toma afronta para si; o que censura o ímpio recebe a sua mancha. Não repreendas o escarnecedor, para que não te odeie; repreende o sábio, ele te amará. Dá instrução ao sábio, ele se fará mais sábio; ensina o justo e ele aumentará em doutrina.” Prov 9; 7 a 9

A sentença primeira não tem como fito tolher à repreensão; antes, direcioná-la ao alvo. Após, temos dois preceitos; um, negativo, ou seja, do que não se deve fazer; outro, oposto aconselhando a ação em seu devido fim. “Não repreendas ao escarnecedor... repreendas ao sábio...”

Spurgeon dizia que uma coisa boa não é boa fora do seu lugar; eis um exemplo! A repreensão. “Seu lugar”, por irônico que pareça a uma análise superficial, é o ouvido do sábio.

Eu disse superficial, pois, a um sábio convém dar ouvidos, não, conselhos. Entretanto, temos o sábio em essência, cujo conteúdo devemos absorver tanto quanto, possível; e o sábio em princípio, que se coloca receptivo ao ensino, humilde, moldável. A esse, se pode instruir. O mesmo Salomão ensina: “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria; o conhecimento do Santo a prudência.” V 10

Ocorrem-me fragmentos de um texto relativamente extenso pra ser reputado provérbio, mas, tentarei reconstruir, sujeito a lapsos. Mais ou menos, o que segue: “Existe aquele que não sabe, e não sabe que não sabe; é um tolo, evita-o; aquele que que não sabe, e sabe que não sabe, é um simples, ajuda-o; aquele que sabe, e não sabe que sabe; está dormindo, desperta-o; aquele que sabe, e sabe que sabe; é um sábio, siga-o.”

Talvez, o nosso sábio em princípio assemelhe-se ao que convém despertar; tem já sábias inclinações; se pode enriquecer compartilhando algo sem o risco de que isso o venha a ofender.

Sim, o individualismo crasso que é cultuado em nossos dias chega a ser cômico, posto que, trágico. Adicionamos umas centenas de “amigos virtuais” a plateia por nós escolhida ante a qual, desfilaremos gostos, imagens, pensamentos, ideias, filosofia... estamos sempre prontos para eventuais elogios, “curtidas” compartilhamentos... mas, ai de quem ousar discordar de nós, criticar, ou algo assim.

Não raro deparo com textos que ilustram bem esse individualismo social que nossa geração adota. Frases, tipo: “Antes de me criticar pague as minhas contas”; “onde está escrito que outros têm algo a ver com minha vida?” “Seja perfeito antes de me julgar.” etc. Ora, a simples exposição de parte de nossos gostos, ideias, demanda já certo julgamento por parte de quem vê. Implicitamente pedimos isso.

Na verdade, não somos refratários ao julgamento; mas, apenas àqueles que consideramos negativos. Os juízos que nos elogiam e aplaudem são sempre bem vindos.

Não tenho problemas com críticas, desde que, fundadas sobre argumentos espirituais ou filosóficos, não, quando patrocinadas por paixões, bandeiras, que cegam e tolhem o senso crítico. As raízes da paixão sustentam o caule putrefato da desonestidade intelectual; esse, não forja frutos palatáveis a um ser de bom siso.

Claro que ninguém é obrigado a se dizer cristão, embora, a ampla maioria o diga, entre nós. E um cristão é instado a agir de modo a que todos tenham a ver com seu modo de vida, ouçamos; “Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador; dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus.” Mat 5; 14 a 16

Ninguém precisa pagar minhas contas, tampouco, ser perfeito para observar meu modo de viver; basta que tenha olhos e habite no mesmo campo visual que eu.

Claro que se descarta por fútil, o juízo temerário e hipócrita do que julga a outrem e não cuida de si. Todavia, a coisa é posta de modo genérico, como se ninguém pudesse ver nada no agir de outro; nada criticável, pois, presto seria atacado como enxerido, intrometido.

Como vimos no princípio, a correção não combina com escarnecedor, embora, fique bem aos ouvidos sábios.

E querendo eu, ou não, esse breve texto é um desses enxerimentos desagradáveis que tem tudo pra levar pedradas. Pior, não pago as contas de ninguém, mal consigo, as minhas; tampouco, pretendo que meu modo de vida seja reputado perfeito.

Entretanto, ouso mesmo assim; que venha uma centena de afrontas, serão suportáveis e justificáveis, se, entre elas, um par de orelhas, pelo menos, estiver pendurado no crânio sortudo de um sábio em princípio. Acho uma boa troca ser afrontado por cem tolos e amado por um sábio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário