“E
sucedeu que, derrubando um deles uma viga, o ferro caiu na água; clamou, e disse: Ai, meu senhor! ele era
emprestado.
E disse
o homem de Deus: Onde caiu? Mostrando-lhe ele, o lugar, cortou um pau, o lançou
ali e fez flutuar o ferro.” II Rs 6; 5 e 6
A intervenção de um profeta do gabarito
de Eliseu para recuperar um simples machado parece de pouca importância. Se,
hoje, qualquer um com aproximadamente 50 reais adquire um, não era assim,
naquele tempo. A arte da forja era rara; os Filisteus geralmente inimigos de
Israel a dominavam. Produtos como arados, lanças e machados era coisas de muito
valor, Tanto que, o aprendiz de profeta teve que munir-se de um emprestado para
sua empresa.
Todavia, a relevância não está no valor, em si; antes, no fato de
Eliseu o ter feito flutuar como se fosse de isopor. Mesmo coisas pequenas que
nos angustiam são alvo dos cuidados de Deus.
Deixando o incidente, por ora,
meditemos um pouco sobre nossas ferramentas. Salomão, o mais sábio dos homens
disse: “Se estiver embotado o ferro e não se afiar o corte, então se deve
redobrar a força; mas, a sabedoria é excelente para dirigir.” Ecl 10; 10 Parece
que Galvão Bueno aprendeu com ele; “Não é força, é jeito.” O pensador usa uma
linguagem poética, não aludindo a ferramentas, estritamente. Uma vez que o “fio”
sugerido é a sabedoria.
Nossos dotes físicos, psíquicos, espirituais, são
meras ferramentas, para a edificação de nossas vidas. Acontece que muitos não
entendem desse modo, e se perdem como se os meios fossem fins. Segundo Mark
Twain, os dois dias mais importantes de nossas vidas são; o dia em que
nascemos, e o que descobrimos, porquê. Contudo, a maioria se comporta como se a
vida nos devesse satisfações; o mundo estivesse em falta com nossos sonhos;
não, nós outros divorciados do propósito e anseio do Criador.
Facilmente
lançamos mão das “filosofias” de buteco, tipo: “Quem não vive para servir, não
serve para viver”. Mas, não é vero? É. Porém, repetir isso sem considerar a
fundo até os bêbados conseguem. Sim, vivemos para servir. Primeiro a Deus que
nos deu a vida; depois, ao nosso semelhante que Ele ama, e está na jornada em
consórcio conosco.
Que sentido teria um construtor, cujos “ossos do hospício” demandam
que tenha certas ferramentas, que sentido, digo, invés de produzir usando-as,
ficar exibindo-as ao público, como se, tê-las já bastasse. Ora, as coisas que com elas fazemos usando-as são a razão de ser,
o fim, das mesmas. Igualmente nós, não importa, se, somos belos, sábios,
fortes, simpáticos, carismáticos, estudados, etc. Essas coisas em si em nada
qualificam nosso caráter. São meros meios que, uns herdamos, outros,
conquistamos via esforço, mas, ainda são simples instrumentos.
Os dons herdados
nada temos com eles; os conquistados demandam nossa participação, esforço,
estudo, preparo. Entretanto, nada substitui a boa índole, caráter; uma
ferramenta certa nas mãos erradas obra em sociedade com o mal. A mesma
ferramenta que muitos usam na construção civil, ladrões usam para arrombar
cofres. Assim, a mau uso de nossos dons, se presta a finalidades vis, quando
nossos caracteres não estão habituados ao culto de bons valores.
Facilmente as
pessoas detestam megeras em novelas, mulheres lindas, que fazem papel de más,
pois, a feiura da alma ofusca os dotes físicos excelentes. Contudo, invés de
aprendermos com isso, geralmente nos sentimos bons pelo simples fato de não
sermos tão maus como aquelas detestáveis personagens. Não raro temos afiada a
foice da crítica, enferrujada a da autocrítica.
Charles Spurgeon dizia que uma
coisa boa não é boa fora do seu lugar. Se alguém duvida, tire o pneu do seu
carro, que é uma coisa boa e use no lugar do volante. Assim, os dons, cada um
atina a determinado fim. Não usamos um serrote para fazer a barba.
Com o
disseminar das redes sociais, todos somos “mestres”. Todos têm algo a dizer,
pouco ou nada, a ouvir. Afinal, podemos bravatear a vontade, espalharmos nossa “sabedoria”
“control V”; mas, seria bom se nos dispuséssemos a pensar sobre nossas
ferramentas e o uso, que delas temos feito.
Admitirmos que nos faltam meios em
determinadas circunstâncias não é problema; problema seria usarmos o instrumento
errado para fingir que podemos solver o que nos é, eventualmente, insolúvel. De
novo, Mark Twain: “ “Quando tudo o que tens é um martelo, tratarás todos os problemas
como pregos.” Nem sempre as coisas se resolvem a marteladas.
A lima da humildade pode remover a ferrugem da
arrogância, e melhorar nosso fio. Ou, seguiremos fazendo força desnecessária
tentando mudar os outros que não podemos, invés de cuidarmos mais de nós, que
devemos.
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