“E
o mais moço deles disse ao pai: Pai dá-me a parte dos bens que me pertence. E
ele repartiu por eles a fazenda. Poucos dias depois, o filho mais novo,
ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua, ali desperdiçou os seus bens,
vivendo dissolutamente.” Luc 15; 12 e 13.
Geralmente pensamos no pródigo como sinônimo
de erros do começo ao fim, salvo, quando “caiu a ficha”, chegou ao
arrependimento e humilhou-se. Certo, não dá para advogar o que fez, exceto, se,
para amenizar sua pena.
Todavia, uma coisa tinha, se, lhe faltava juízo; noção
do ridículo, autocrítica. Já que estava decidido a “soltar a franga”,
esbaldar-se na esbórnia, “partiu para uma terra distante”. Tanto seria ridículo
ficar cantando loas à família, ao amor do Pai, bêbado no meretrício; quanto,
trazer a bebida e as ditas “damas” para escandalizar a família. Afinal, a casa
do Pai era local de respeito, trabalho, disciplina. Desse modo, o fez ausente da vista dos seus.
“Queres saber se os conselhos da noite são
bons, pratique-os durante o dia”; disse o poeta Zeferino Rossa. Noutras
palavras: Queres entender se são boas tuas resoluções? Pratique-as ante os
olhos dos teus. O simples precisar esconder, já é íntima admissão de culpa.
Lembro o exemplo de Moisés. “E olhou a um e a outro lado, vendo que não havia
ninguém ali, matou ao egípcio e escondeu-o na areia.” Ex 2; 12 Antes do
assassinato certificou-se que não haveria testemunhas; depois, ocultou o
cadáver. Todavia, o próprio hebreu que defendera acabou acusando-o.
A rigor, é
impossível praticarmos algo sem que ninguém veja. Além de Deus, claro. Todo
homem é tripartido; corpo, alma e espírito. Alma, fonte dos desejos; corpo, meio
de expressão; o espírito, o árbitro que autoriza ou, veta as escolhas. A isso
chamamos consciência.
Quando tomamos uma decisão que, de antemão sabemos que
devemos praticar em oculto, nossa alma rebelde está dizendo ao espírito que,
decidiu fazer e pronto, não tá nem aí para a opinião do espírito.
Quando Paulo
evoca a lisura de sua alma chama o espírito como testemunha. “Em Cristo digo a
verdade, não minto (dando-me testemunho a minha consciência no Espírito Santo):
Rom 9; 1 Põe o espírito humano como testemunha ante ao Espírito Santo. Desse
modo, nunca estamos sós a ponto de nossos atos não serem vistos por duas
testemunhas, pelo menos; e testemunho de dois é válido no Tribunal Eterno.
Quantas vezes presenciei pessoas saindo ao encontro dos vícios bradando: “Não
quero nem saber!” Mas, quem estava fazendo saber que sua escolha era má, se,
não havia censura externa? Estava direcionando sua “diatribe” contra si mesmo,
contra os avisos da consciência.
Então, aquele que oculta para praticar o erro,
posto que errado, ao menos tem noção do ridículo, sua consciência ainda fala.
Pior que esse é outro que, de tanto arrostar a consciência na obstinação pelo mal, cauterizou-a;
ela não “apita” mais. “Conservando a fé, e a boa consciência, a qual alguns,
rejeitando, fizeram naufrágio na fé.” I Tim 1; 19 Vemos, pois, que o barco da
fé não afunda se, ouvirmos e seguirmos nossas consciências, senão, já era.
Contudo, aquilatando erros de caráter temos ainda um “upgrade”. Digo, se o sem
noção que perdeu o senso do ridículo é pior que outrem que se esconde para
pecar, o disfarçado, o hipócrita é ainda pior. Esse sabe que seu agir é errado,
conhece que o ambiente não comporta; traveste-se de justo usando falsidade. O
que chamamos, lobo em pele de ovelha.
Infelizmente, esse é o tipo mais nocivo,
e comum. Daria um dedo pela aceitação humana, sem deixar de fingir a aprovação
Divina. Peca na casa do Pai, com suas prostituições de alma, disfarçadas.
Isaías denunciou: “Ainda que se mostre favor ao ímpio, nem por isso aprende
justiça; até na terra da retidão pratica a iniqüidade, não atenta para a majestade
do Senhor.” Is 26; 10
Muitas vezes acontecem rupturas violentas em
congregações; sofremos porque irmãos que eram “uma bênção” partiram para “uma
terra distante”. Não raro, é Deus higienizando o rebanho, banindo ao hipócrita
para seu devido lugar.
O Salmo primeiro ensina: “...os ímpios... são como a
moinha que o vento espalha. Por isso, os ímpios não subsistirão no juízo, nem,
os pecadores na congregação dos justos.” Sal 1; 4 e 5 Nem toda divisão se
encaixa nesse perfil, mas, quando é assim, por dolorosa que pareça, é salutar.
Em
suma, se nossas vontades enfermas forem mais fortes que a consciência, não
enganemos na casa do Pai, para que à nossa dissolução não acrescentemos a
hipocrisia, a profanação.
Quem sabe, como o pródigo, depois que estivermos
comendo com os porcos, a consciência volte a ter nossa atenção.
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