“A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira.” Prov 15; 1
Parece
que o jeito de falar tem a possibilidade tanto de desviar, quanto,
atrair o furor. Embora, normalmente o conteúdo se associe à forma, digo,
palavras conciliadoras são proferidas com jeito manso, educado, e
agressivas com voz forte, isso não é regra.
Conheci
um sujeito que se dizia pastor, sem nenhum caráter; quando contestado
em suas falcatruas conseguia proferir as maiores ofensas sem alterar o
tom da voz, o que irrita ainda mais, não bastasse o teor sórdido.
A
meu ver, o contraste supra da palavra branda com a dura sugere
conteúdo e forma. Assim, nada valeria falar como um padre no
confessionário, sussurrando, se as palavras proferidas cortarem como
facas; posto que mascaradas de brandas, seriam duras.
“Porventura o ouvido não provará as palavras como o paladar prova as comidas?” Jó 12; 11
Basta ler o contexto da assertiva pra ver que não se refere ao tom,
mas, ao que estava sendo dito. Os amigos de Jó exortavam-no ao
arrependimento; a acusação sem provas era que seu sofrimento deveria
advir de alguma culpa. O infeliz suspirou: “Vós, porém, sois
inventores de mentiras, todos, médicos que não valem nada. Quem dera vos
calásseis de todo, pois isso seria a vossa sabedoria.” Cap 13; 4 e 5
A frase evocou-me um proverbio indiano: “Quando falares, cuida para que tuas palavras sejam melhores que teu silêncio.” Aqueles, não tiveram esse cuidado.
Claro
que, numa eventual contenda com exasperação mútua, um sábio interviria
com palavras brandas tentando levar as partes a se desarmarem, para
buscar conciliação; diverso do tolo; “Os lábios do tolo entram na contenda, e a sua boca brada por açoites.” Prov 18; 6
Sempre
que consideramos o poder da palavra imediatamente pensamos na de Deus.
Certo, nada há igual. Contudo, mesmo a humana tem lá sua força. É capaz
de grandes coisas, tanto para bem, quanto, mal. “A morte e a vida estão no poder da língua; e aquele que a ama comerá do seu fruto.” Prov 18; 21
Isso
não nos autoriza a sair decretando, ordenando coisas, para que
aconteçam como ensinam alguns pavões abobados. Antes, adverte que
sejamos prudentes ao falar, pois, um falso testemunho, por exemplo, pode
condenar à morte um inocente; como, o oposto, livrá-lo. “Há
alguns que falam como sendo uma espada penetrante, mas a língua dos
sábios é saúde. O lábio da verdade permanece para sempre, mas a língua
da falsidade, dura só um momento.” Prov 12; 18 e 19
O mesmo texto interpreta que o fio dessa “espada” mortal é a falsidade.
Acontece que, as coisas que cobramos de terceiros acabam sendo leis pra nós; como esperar de outrem o que não oferecemos? “Mas
eu vos digo que de toda a palavra ociosa que os homens disserem hão de
dar conta no dia do juízo. Porque por tuas palavras serás justificado, e
por tuas palavras serás condenado.” Mat 12; 36 e 37
Afinal, o poder espiritual “trabalha” sobre nossas palavras à exata proporção que se alinham à do Senhor; Paulo Ensina: “Retendo
firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja
poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, quanto para convencer
os contradizentes.” Tt 1; 9
Assim, o poder da Palavra em âmbito espiritual é de Deus, não nosso; a nossa pode lograr outros feitos, como vimos.
Nem tudo, porém, pode ser dito de forma branda; cada espada tem sua própria bainha. Ouçamos o Mestre: “Ai
de vós, escribas e fariseus, hipócritas! que devorais as casas das
viúvas, sob pretexto de prolongadas orações; por isso sofrereis mais
rigoroso juízo.” Mat 23; 14 ou, João Batista; “…Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura? Produzi frutos dignos de arrependimento;” Mat 3; 7 e 8 Coisas assim não podem ser ditas à meia voz.
Entretanto, quando da farsa do Julgamento do Salvador, ele foi agredido
por um serviçal do Sumo sacerdote, e redarguiu com uma pergunta
branda: “…Se falei mal, dá testemunho do mal; se bem, por que me feres?” Jo 18; 23
Se tivesse dito; canalha! Seria ferido mais; mas, ao requerer motivos
para a violência num gládio de palavras desarmou o valentão.
Palavras,
esses veículos possíveis à razão, que nos faria superiores aos animais,
depois da queda nos têm inferiorizado. Os instintivos são fiéis aos
instintos; a maioria das falas humanas são laços.
Às
vezes a brandura da forma disfarça o veneno do teor; outras, a ênfase
acentuada na mentira reveste-a de verossimilhança. Felizes os que têm
paladar apurado! “O simples dá crédito a cada palavra, mas o prudente atenta para os passos.” Prov 14 ; 15
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